por Alberto Handfas, Presidente da Adunifesp, Delegado ao 42º Congresso do Andes-SN
O plenário do Congresso do Andes-SN (26/02 a 01/03 em Fortaleza – CE), decidiu com margem estreita de votos por uma “greve no 1o semestre” de docentes nas Universidades e Institutos Federais. Decisão a ser submetida às Assembleias de ADs.
Delegado representante da Adunifesp, gostaria de compartilhar com colegas docentes da Unifesp algumas considerações e opiniões sobre tal decisão, bem como sobre a continuidade da luta pela imediata recuperação de nossos salários.
Impasse na negociação
A Mesa Nacional/2024 segue por mais de um semestre num impasse. Em sua 7ª Rodada (em 28/02), o governo manteve inalterada sua disposição em conceder apenas reajuste salarial em 2025 e 2026 (4,5% ao ano) e zero neste ano – apenas elevando os valores de benefícios.
Assim o governo rejeitou apresentar uma contraproposta ao 34,32% (em 3 parcelas de 10,34% 2024/25/26) reivindicado pelos sindicatos de servidores públicos federais (SPFs), incluindo o Andes-SN. Ao mesmo tempo, o governo manteve uma promessa de “avaliar a possibilidade de um reajuste em maio/2024 caso as receitas da União cresçam neste 1º trimestre de 2024”. Algo inadmissível em nossa opinião bem como na dos demais sindicatos.
Pois docentes federais, bem como o conjunto dos SPFs tiveram um terço de seus salários corroídos pela inflação desde o Golpe de 2013. O que, além de criar enorme estresse na vida pessoal e familiar de milhões de trabalhadores (incluindo nós, docentes), corrói a qualidade técnica e profissional do quadro de prestadores de serviços essenciais à população – comprometendo assim o próprio serviço público e prejudicando as sofridas população e nação brasileiras. Os SPFs, junto com seus sindicatos, lutaram nos últimos anos para impedir a destruição dos Serviços Públicos e de suas carreiras e salários pelos golpistas Temer e Bolsonaro. E por isso, inclusive, engajaram-se para derrotar este último em novembro/2022 e, portanto, para eleger Lula. O reajuste zero fica ainda mais inaceitável – e também inexplicável – quando se sabe que o governo concedeu ajuste exclusivo (de 2% a 22%) aos policiais federais e rodoviários federais.
Motivos da recusa: NAF e Centrão
A decepcionante recusa do governo atender nossa pauta decorre obviamente de sua política de acomodação frente às pesadíssimas pressões reacionárias daqueles que, embora derrotados na eleição de 2022, seguem impondo seu programa: os golpistas, os “mercados”, a mídia e o Congresso dominado pelo Centrão bolsonarista.
Por um lado, a equipe econômica (pressionada pelos “mercados”), ao invés de eliminar qualquer Teto a gastos sociais – mesmo desconsiderando aqueles já existentes antes do Golpe/2016 – preferiu troca-lo pelo NAF. Este, embora menos draconiano, segue limitando muito a recuperação das verbas sociais – incluindo a com salários dos SPFs.
Por outro, Lira e o Centrão sequestraram o Orçamento das mãos do Executivo. Com manobras regimentais e legais, eles quase dobraram as verbas para Emendas Parlamentares para mais de R$ 53 bi, recriando inclusive mecanismos do malfadado Orçamento Secreto. Ademais quase quintuplicaram as verbas ao Fundo Eleitoral. Da parcela das verbas discricionárias (aquelas não constitucionalmente vinculadas), os parlamentares controlavam 4,5% antes do Golpe de 2016 (contra 0,1% na França, 0,2% em Portugal ou 2,4% nos EUA). Agora passaram a controlar 20% . O Executivo (que deveria ter a democrática prerrogativa de elaboração orçamentária – de acordo com as prioridades programáticas pelas quais foi eleito pelo voto popular) perdeu enorme margem de manobra para alocar verbas, inclusive a reajuste dos SPFs, algo que o Centrão ojeriza.
Nas Assembleias da Adunifesp realizadas no final do ano passado e início deste, tais problemas foram trazidos ao debate entre docentes e traduzidos em quatro entendimentos razoavelmente consensuais:
(a) É urgente organizar a luta em massa dos SPFs e dos movimentos populares em defesa de mais verbas aos Serviços, o que incluí o reajuste dos servidores;
(b) Tal luta deve ser direcionada tanto para combater o Centrão no Congresso quanto para pressionar o Executivo a apresentar um reajuste decente (algo que não fez até o presente); pressiona-lo inclusive a romper com a acomodação e a enfrentar o Centrão, apoiando-se inclusive na mobilização popular;
(c) Para tanto é necessário um movimento engajado e de massas desde a base das categorias, algo que ainda não tem ocorrido entre docentes do Magistério Superior (revelado no baixo quórum das assembleias de ADs pelo país afora, conforme a quase totalidade dos relatos de ADs nas reuniões do Setor das IFEs do Andes);
(d) Tal quadro pode sim ser alterado nos próximos meses com um esforço coletivo de mobilização que, tendo sucesso e no caso da Mesa persistir em impasse, permitiria criar condições para uma forte e resoluta greve unitária dos SPFs – da qual docentes participariam ao mostrarem disposição de manterem-se majoritariamente mobilizados em atividades paredistas em ou em torno de seus campi, alunos etc. Greve que, se forte e unitária, será o instrumento mais efetivo para quebrar as resistências (Centrão, NAF) e arrancar conquistas salariais.
Foi com base nesses pontos que eu fui eleito delegado da Adunifesp ao 42º Congresso do Andes.
Debate e votação da greve no Congresso do Andes
Outras ADs de IFES igualmente vinham realizando assembleias para discutir estratégias de luta que permitam superar a ainda tímida participação da base docente e organizar a luta pela reivindicação. Com base em tais AGs, delegados foram eleitos bem como TRs (Textos de Resoluções) foram submetidos ao Congresso do Andes. Na Plenária do Congresso que decidiu sobre a greve, o debate se estabeleceu a partir de três propostas de resolução:
(1) “Dar continuidade ao trabalho de unidade de ação com demais SPFs, visando fortalecer as Campanhas Salariais de 2024 e 2025, intensificando a mobilização da base , tendo como horizonte a construção de uma greve unificada no funcionalismo público federal em 2024, persistindo o quadro da ausência de negociação real.”
Tal proposição foi por mim apoiada por considera-la em sintonia com as discussões feitas nas últimas assembleias da Adunifesp (pontos “a” – “d”). Ela baseia-se no TR submetido em janeiro pela diretoria do Andes-SN, com a adição apenas do trecho final (em negrito). Foi defendida, dentre outros(as), por colegas delegadas do Fórum Renova Andes.
(2) “Dar continuidade ao trabalho de unidade de ação com demais SPFs, visando fortalecer as Campanhas Salariais de 2024 e 2025, intensificando a mobilização da base para uma greve do setor da educação que tenha como horizonte a construção de uma greve unificada no funcionalismo público federal em 2024, por recomposição salarial imediata e integral”.
Esse texto foi defendido pela própria diretoria do Andes, que, portanto, alterou na última hora sua posição inicial em favor de orientar o Andes à adesão a uma greve apenas da educação federal, que supostamente arrastaria mais adiante demais SPFs. Lembrando que tal greve, por tempo indeterminado, está marcada pelo sindicato dos técnicos e talvez dos IFs, (Fasubra e Sinasefe) já para o dia 11/03.
(3) “Dar continuidade ao trabalho de unidade de ação com demais SPFs, visando fortalecer as Campanhas Salariais de 2024 e 2025, intensificando a mobilização de base, na construção de greve do Andes e do setor da educação no primeiro semestre de 2024, tendo como horizonte a construção de uma greve unificada no funcionalismo público federal em 2024.
Tal proposta, igualmente baseada na TR da diretoria, é similar à (2). Ela, contudo, aponta para a possibilidade de uma greve do Andes independente da greve da educação (embora obviamente ambas sejam defendidas) que, adiante, supostamente arrastaria demais SPFs. Companheiros em geral que haviam composto a chapa 2 na última eleição do Andes foram seus proponentes. Dentre discursos de seus defensores, houve aqueles que explicavam que tal greve objetiva também “derrubar o governo neoliberal de Lula” deixando um certo clima de dejá vu no auditório (“Fora Dilma, Fora Todos” em 2016…)
Greve já por cima e isolada, ou preparar pela base forte luta, incluindo uma greve unitária?
A despeito do debate acalorado estabelecido no plenário do Congresso, note-se que as três proposições apontam para a necessidade de intensificar a mobilização com um horizonte de greve como instrumento agudo para efetivamente quebrar a resistência à aceitação da reivindicação e garantir seu atendimento (ainda que parcial).
As defensoras da proposta (1), contudo, chamavam a atenção para o fato de que a categoria docente – em sua imensa maioria ainda em férias escolares – está até aqui (infelizmente) bem menos mobilizada (AGs esvaziadas) para aderir a uma greve “pra valer” – a iniciar-se uma semana após o Congresso Andes! Ademais enfatizavam que a mobilização (incluindo a possibilidade da greve) deve servir para forçar a negociação na Mesa (e a pressão no Congresso) e que tal greve só pode ser efetiva caso seja unitária dos SPFs (cuja imensa maioria dos sindicatos não tem greve marcada ainda) – forçar seu início imediato, sem mobilização real da base docente e de forma isolada dos demais SPFs é algo voluntarista. É também a melhor forma de enterrar a greve e o movimento pelo reajuste em seu nascedouro.
Já defensores(as) da (2) e da (3) refutavam tais argumentos, não vendo problemas de iniciar uma greve sem a imensa maioria dos SPFs (baseando-se na hipótese, desprovida de provas, de que eles “aderirão à nossa greve mais adiante”) e insistiam que é facilmente exequível faze-lo junto à base docente. Gritos de “greve já!” foram puxados por apoiadores da proposta (3), arrastando inclusive alguns (não todos) da (2).
Votação da greve e consulta à base
A votação encaminhada pela mesa do Congresso teve dois turnos. Primeiro votou-se a proposta (1). Foi derrotada, obtendo cerca de 120 votos. Depois votou-se entre as outras duas. A (3) foi a vencedora com 182 votos; e a (2) obteve 136. O que significa que o Congresso indica aos docentes iniciarem uma “greve já” no dia 11/03. Lembrando que há mais de 700 delegados participando do Congresso, sendo que menos da metade deles estava presente no plenário na votação. E menos da metade dessa metade de fato votou na “greve já”.
Em todo o caso, o importante agora é voltarmos às nossas universidades e – como faríamos em qualquer caso – chamarmos a base para o debate e a mobilização neste início de semestre letivo. A base docente em todo o país precisa ser consultada se concorda com – e está disposta a engajar-se plena e amplamente em – tal “greve já”; ou se tem preferência por outra estratégia que considere mais exequível e efetiva. De nossa parte, a Adunifesp está chamando nas próximas duas semanas reuniões e assembleias nos campi para que docentes desde a base debatam o assunto, envolvam-se no movimento e indiquem uma (ou mais) posição. A partir daí, no dia 13/03, uma Assembleia Geral está convocada para deliberar o que a Adunifesp fará. Uma reunião nacional de ADs das IFEs do Andes deve ocorrer na semana seguinte e ali, será avaliada a aderência à decisão congressual e com base nisso a diretoria do Andes, junto com as ADs (incluindo a Adunifesp) procurarão encaminhar a luta – unitária em qualquer caso!