Recuperar os salários e os Serviços Públicos!

Notas sobre a Campanha Salarial dos Servidores de 2024, o Arcabouço e os serviços públicos – por Alberto Handfas, Professor de Economia da Unifesp e Diretor da Adunifesp.

O objetivo deste artigo é contribuir com o debate sobre a campanha salarial dos servidores públicos de 2024. Para tanto, a partir de uma breve contextualização histórica e política da presente situação salarial, avaliaremos as pautas reivindicativas apresentadas pelos sindicatos ao governo frente às limitações impostas, não mais pelo Teto (EC-95) mas agora, pelo Novo Arcabouço Fiscal (NAF). A partir de um exercício numérico, notamos que qualquer luta – seja salarial dos servidores, seja em defesa de programas sociais – terá de se transformar numa batalha contra as regras do NAF. Com base nisso, levantamos sugestões para a mobilização geral em defesa não apenas da recuperação salarial, mas também dos serviços públicos e da democracia no país, inclusive contra o golpismo fascista à espreita.

Os dois fóruns sindicais que representam os Servidores Públicos Federais (SPFs) do poder Executivo, Fonasefe e Fonacate, protocolaram no Ministério da Gestão suas pautas de reivindicações a serem barganhadas com o governo na Mesa Nacional de Negociação 2024 (veja aqui a pauta do Fonasefe e aqui a pauta do Fonacate).

A Mesa 2023 foi a primeira realizada após mais de seis anos de governos golpistas de Temer e Bolsonaro, que congelaram salários, atacaram direitos trabalhistas e serviços públicos, além de terem recusado qualquer diálogo com sindicatos. Ela concluiu seus trabalhos em abril último com um acordo emergencial que repôs apenas 9% (a partir de junho/2023) das perdas inflacionárias.

Conquista parcial de 2023

O reivindicado era a reposição de todas as perdas durante o governo Bolsonaro (2019-2022), equivalente a 26,9%. Por se tratar de uma campanha emergencial ocorrida na politicamente tensa e instável transição entre o golpismo anti-classe trabalhadora boslonarista e o novo governo Lula, os sindicatos optaram por não exigir no momento as perdas inflacionárias anteriores (do período Temer e mesmo prévias). Ainda que muito limitado, portanto, o 9% foi aceito pelos sindicatos como uma vitória parcial mediante a compreensão de que o novo governo teria muitas dificuldades políticas para elevar a exígua dotação (R$ 11 bi) destinadas a reajustes de SPFs na Lei Orçamentária (LOA) 2023.

Tal LOA fora imposta pelo governo anterior em conjunto com o Centrão, que, junto com parlamentares bolsonaristas de extrema direita, seguem controlando com ampla maioria o Congresso na atual legislatura. Elevar a dotação ao reajuste de SPFs exigiria um pedido do executivo ao legislativo para aprovar lei complementar que concedesse créditos extraordinários; algo que seria rejeitado pela maioria congressual, reacionária e avessa aos serviços e servidores públicos. A despeito dessa compreensão e da aceitação do acordo, os sindicatos exigiram, contudo, completar o atendimento do reivindicado a partir da nova LOA (2024) e o governo aceitou abrir nova Mesa de negociação.

As pautas apresentadas à Mesa 2024

Na atual Mesa (2024), ambos os fóruns reivindicam a equiparação entre os dois grupos de carreiras de SPFs – cujas parcelas diferenciadas de reajuste, acertadas no acordo de 2015, acabaram resultando em reposições desiguais. Isso porque naquele ano, uma parte dos sindicatos representantes de certas carreiras optou por já definir com o governo o recebimento da reposição inflacionária (2012-2015) acordada em quatro parcelas (2016, 2017, 2018 e 2019). Outra parte (docentes inclusive) havia optado por receber apenas duas parcelas (2016 e 2017) e renegociar o restante em um novo acordo com o governo – algo que o golpe e os governos que dele vieram impediram que ocorresse. Assim a segunda parte dos SPFs acabou recebendo menos reposição do que a primeira.

Ambos os fóruns também mantiveram em suas pautas todos os “itens não-salariais” reivindicados na Mesa 2023, mas não atendidas ainda. Dentre elas destacam-se: a reposição inflacionária (com equiparação ao já obtido no Legislativo e Judiciário) dos benefícios e auxílios (Saúde, Transporte, Alimentação etc); a abertura imediata das Mesas Setoriais (que discutirão a reestruturação/recuperação das carreiras); a reabertura de concursos para recompor o quadro de funcionamento dos serviços públicos, e o “revogaço” das medidas (decretos/portarias/leis do período Temer e Bolsonaro) que atacam os serviços públicos e os direitos da classe trabalhadora – algumas já foram revogados pelo novo governo, mas ainda faltam outras.

Os fóruns também reiteraram nesta nova Mesa a exigência para que o governo complete a reposição das perdas inflacionárias dos últimos anos (cujo reajuste de 9% cobriu apenas uma pequena parte). Aí, porém, cada fórum aborda tal demanda de forma um pouco diferente.

Diferentes abordagens

O Fonacate (que reúne sindicatos das carreiras “típicas de Estado”), sem pré-definir índice específico de reajuste (nem número/data de parcelas a seu pagamento), demanda que o governo complete a concessão do reajuste reivindicado na Mesa 2023: a reposição das perdas 2019-2023 ainda não recuperadas pelo 9% do acordo emergencial de abril/2023. Exige, em qualquer caso, incluir nas parcelas de tal reposição a inflação corrente (entre 2023 e a data de cada eventual parcela: 2024, 2025 etc.).

O Fonasefe (do qual fazem parte os sindicatos da docência federal), apresenta a reivindicação da recuperação da parte das perdas inflacionárias desde 2010 ainda não repostas pelos acordos desde então. A inflação acumulada entre junho de 2010 e julho 2023 é de 113,92%. Em todo esse período, ocorreram três acordos de reposição inflacionária (todos nos governos Dilma e Lula – em 2012, 2015 e 2023). Ao todo, eles garantiram um reajuste de 39,77% nos salários das carreiras que optaram por duas parcelas no acordo 2015 e de 53% nos salários das que optaram por quatro parcelas.

Portanto, o Fonasefe apresenta nesta Mesa/2024 a reivindicação de reposição da perda ainda não reposta (a inflação 2010-2023 de 113,92%, excetuando-se disso o já reposto em cada um dos dois casos): respectivamente 53,05% ao primeiro grupo de servidores e 39,82% ao segundo. Apresenta também a sugestão ao governo de pagamento de tal reposição em três parcelas que já incluíssem as inflações entre julho 2023 até a data de cada parcela.

Enfrentar os obstáculos

Pode-se discutir qual abordagem é a mais adequada a se levar à mesa de negociação. Há quem se questione sobre o critério para definir o horizonte temporal das perdas cuja reposição deva ser reivindicada (por que apenas desde 2019 e não desde 2016?; por que desde 2010 e não desde FHC?  Ou desde Sarney…). Todas considerações são legítimas e devem ser ponderadas, não no abstrato nem tampouco seguindo dogmas; mas mediante a avaliação da realidade concreta como: a correlação de forças, a conjuntura política ou o estado de ânimo da mobilização da categoria. Esse tema, ainda que essencial ao debate na base dos sindicados (e de nossa AD) de imediato, está além do escopo deste artigo específico. O que pretendemos debater aqui, ao invés, é sobre o enfoque necessário à mobilização de base para enfrentar os obstáculos ao cumprimento da reposição salarial.

O golpe de 2016 atacou profundamente os trabalhadores e os serviços públicos. A maioria reacionária do Congresso segue empenhada em manter tais investidas. Embora, graças inclusive à resistência das mobilizações dos SPFs, Guedes, Bolsonaro e o Centrão falharam em aprovar a Reforma Administrativa (PEC-32), Lira segue ameaçando tira-la da gaveta e aprova-la na Câmara. Com as mesmas intenções, o Teto de Gastos de Temer (EC-95) avançou contra os serviços públicos forçando uma aguda redução, ano a ano, de seu tamanho. Gerou e aprofundou assim uma crise social e econômica sem precedentes no país. Suas regras draconianas impediram na prática quaisquer reajustes salariais ou concursos que recuperassem o quadro dos serviços públicos. O novo governo Lula tem tomado medidas positivas (que devem ser defendidas pelo movimento sindical e popular) para desfazer o estrago provocado nesses últimos anos, como por exemplo, a retirada de várias empresas da lista de privatização.

Entretanto, o Novo Arcabouço Fiscal (NAF), que está sendo aprovado no Congresso em substituição à EC-95, segue impondo severas e contraproducentes restrições aos gastos sociais. Ainda que mais flexíveis e suaves que as travas do Teto Temer, suas regras fiscalistas também levarão à redução paulatina (ainda que menos aguda) dos serviços públicos no PIB, além de não garantirem seu (NAF) suposto propósito originário – o desenvolvimento do país e a estabilização/redução do endividamento (veja mais sobre o NAF aqui ou aqui). Ademais, se não impedirão, serão certamente um forte dificultador a qualquer tentativa significativa de recuperação salarial do funcionalismo.

Simulação da reposição salarial sob as regras do NAF

Para avaliar isso, apresentamos a seguir um exercício que procura checar – de forma arredondada e aproximada apenas – como responderão as regras do NAF à possível implementação da reposição salarial reivindicada – tanto na abordagem da Fonasefe quando na da Fonacate. Suporemos aqui, para simplificar, que metade dos SPFs haviam recebido o reajuste do acordo de 2015 em duas parcelas e outra metade em quatro. Estima-se aqui também que cada 1% de aumento no salário do funcionalismo federal (executivo apenas) em 2024 representaria um gasto aproximado de cerca de R$ 2,210 bilhões – em valores de jun/2023 (apêndice A).

No caso dos índices sugeridos pela Fonasefe (39,82% à metade dos SPFs e 53,05% à outra), eles seriam aplicados em três parcelas de 11,82% e de 15,24% em cada ano (de 2024 a 2026). Assim, a taxa média de reajuste anual sobre a massa total de salários seria de 13,53% (acrescidas da possível inflação que ocorrerá até a data de cada parcela). Isso significaria acréscimos crescentes nas despesas com Pessoal (apêndice B) bem acima da despesa primária total que, de acordo com o NAF (se todas suas regras e metas forem cumpridas), só poderá crescer no máximo 2,5% ao ano.

E, para complicar ainda mais, é provável que a despesa conjunta com Saúde e Educação também cresça obrigatoriamente mais que isso, uma vez que, com a EC-95 caducando, essa despesa volta constitucionalmente a vincular-se às receitas. Assumiremos neste exercício que Saúde/Educação cresça 4% ao ano (apêndice C). Para crescer acima do limite máximo do total das despesas primárias, as rubricas “Saúde/Educação” e “Folha Salarial” ocuparão o espaço de crescimento total, esmagando assim as demais despesas – desde o Bolsa Família até o Minha Casa, Minha Vida, passando pelos inúmeros programas sociais e de desenvolvimento como nas áreas de saneamento, Ciência e Tecnologia ou Reforma Agrária.

Assim, conforme demonstrado no apêndice D, (se for garantido nas LOAs dos próximos três anos o crescimento real anualizado de 4% à Saúde/Educação e de 13,53% à Folha Salarial, para atender o reivindicado Fonasefe), as regras do NAF forçarão todas as demais despesas primárias a um crescimento médio máximo inferior a 0,5% ao ano até 2026!

No caso da abordagem da Fonacate, sugere-se a demanda ao governo de completar o pagamento da reposição inflacionária reivindicada (consensualmente por ambos os fóruns) na Mesa/2023. Propugna-se também – igualmente à pauta da Fonasefe – a equiparação dos grupos de carreiras de SPF que optaram por duas aos que optaram por quatro parcelas no acordo 2015. O que igualmente exigiria um reajuste de 9,5% a mais ao primeiro grupo. Assim, acumulando-se a inflação do período Boslonaro/2019-2022 (26,94%) com a do primeiro semestre de 2023 (2,79%, conforme apêndice G) e excetuando-se o 9% já concedido (jun/23), o índice de reposição a ser reivindicado na Mesa/2024 seria de 19,71% ao segundo grupo de SPFs e 31,04% ao primeiro (que inclui os docentes). Se a Fonacate (como a Fonasefe) sugerir também o pagamento de tais índices em três parcelas até 2026, o governo teria de, em cada um dos próximos três anos, ir elevando em 9,43% os salários do primeiro grupo e em 6,18 % os do segundo – sempre acrescendo a tais reajustes a possível inflação até a data de cada parcela.

Neste caso, aqui também supondo que as massas totais de salários de cada um dos grupos de SPFs fossem iguais, a média de reajuste anual seria de 7,8%. Assim, aplicando-se exatamente as mesmas lógica e hipóteses usadas na simulação do caso Fonasefe acima, pode-se avaliar (ver detalhes no apêndice F) as consequências do reajuste sugerido pelo Fonacate no quadro imposto pelo NAF. Suas regras forçarão todas as demais despesas primárias a um crescimento anual médio máximo inferior a 1,4% até 2026!

Em ambos os casos, fica evidente que as regras do NAF opõem demandas sociais umas contra as outra visando gerar superávits primários a serem desviados ao pagamento de juros.

Podemos ainda fazer um exercício reverso e supor que seja imposto (pelo Congresso e/ou governo) que o crescimento salarial a ser aceito na PLOA não possa ultrapassar o crescimento das demais despesas primárias (excetuando-se Saúde & Educação). Neste caso (apêndice G), o índice máximo concedido à recomposição das perdas salariais de inflação em 2024 seria 2,15% (acrescido da inflação de hoje até a data da parcela); em 2025 seria 2,14% (mais a inflação de 2024); em 2025, 2,13% … e assim por diante, de maneira que tal índice máximo decresça lentamente. Isso significa que a reposição das perdas inflacionárias demandada seria, na melhor das hipóteses, paga à conta-gotas: no caso Fonasefe só seria completada em 2034; no caso Fonacate, somente em 2041…

Os limites impostos ao crescimento das demais despesas primárias em cada um desses três casos estão ilustrados no gráfico abaixo:

Os perigos políticos do NAF

A simulação das respostas do NAF às demandas de reajuste propostas em qualquer uma das abordagens (Fonasefe e Fonacate) mostram que suas (NAF) regras reduzem dramaticamente a possibilidade de repor de maneira minimamente significativa as perdas inflacionárias nos salários. Por isso a campanha salarial deste ano precisa passar pela batalha para derrubar ou ao menos flexibilizar ao máximo tais regras.

Aliás, batalhar contra tais regras fiscalistas é uma necessidade para defender os serviços públicos e a própria recuperação do desenvolvimento nacional. Pois o NAF também impedirá a forte retomada de gastos sociais tão esperada pelo povo trabalhador, particularmente aquele que lutou contra Bolsonaro e ajudou a eleger Lula.

Importante notar, aliás, que de nada adiantará uma forte elevação de receitas. Mesmo que – fruto de uma suposta reforma tributária eficiente/progressiva muito bem sucedida e/ou de um gigantesco boom de crescimento (novo ciclo de commodities, por exemplo) – haja uma forte elevação na arrecadação, o NAF seguirá segurando drasticamente (como vimos) as urgentes elevações em gastos sociais. Pois os dispositivos do NAF – a despeito de mais suaves do que os da EC-95 – são feitos essencialmente para canalizar todo o crescimento da receita acima do (baixo) limite de crescimento de gastos sociais aos gastos financeiros.

O NAF impedirá, portanto, a recuperação ou a expansão dos programas sociais e de desenvolvimento do período Lula-Dilma. Basta comparar o limite NAF de crescimento (2,5%) com a taxa anual real de crescimento de 7% dos gastos primários ocorrida naqueles governos (2003 a 2014); ou a taxa de 8,5% de 2003 a 2010. E impedir a retomada de tal crescimento na atual crise social e instabilidade política atual (lembremos do 8 de janeiro último!) é uma tremenda imprudência. Pois a frustração popular que tende a acumular-se com o tempo pode facilmente ser manipulada pelo fascismo e golpismo que, de tocaia, esperam o momento para desestabilizar o governo Lula – que nós, ativistas sindicais e do movimento docente (junto com milhões de trabalhadores mobilizados e conscientes) ajudamos a eleger e queremos defender contra as direitas golpistas.

A luta salarial é a luta em defesa dos Serviços Públicos

Com tal perspectiva de luta, é preciso lançar a discussão das pautas de reivindicações na base das categorias dos SPFs para iniciar a organização e mobilização de campanha salarial 2024. E, a partir daí, é importante que os servidores mobilizados se dirijam ao povo brasileiro em uma campanha pública de massas com material didático, impresso, áudio visual e nas redes sociais. Uma campanha que mostre os fatos e, assim, desmonte a propaganda mentirosa midiática que há décadas demoniza o funcionalismo público, acusando-o de “marajá”. Uma campanha que mostre o quão arrochados estão os salários da imensa maioria dos servidores (os salários nababescos – que existem e deveriam sim ser combatidos – são os de uma ínfima minoria encastelada nas cúpulas do Judiciário, Legislativo, FFAA etc).

Uma campanha pública que demonstre que, enquanto banqueiros e especuladores batem recordes de lucros bilionários às custas dos juros da dívida, a quantidade de bens que o salário do servidor era capaz de comprar há alguns anos atrás reduziu-se pela metade!

Precisamos, enfim, de uma campanha que mostre que a luta pela recomposição salarial dos servidores não só é absolutamente justa e indispensável para revalorizar suas carreiras e recuperar suas pauperizadas condições de vida, mas também para reconstruir o próprio combalido serviço público, que o sofrido povo brasileiro tanto necessita. Uma campanha capaz de sensibilizar a sociedade, mobilizar servidores em todo o país e pressionar fortemente parlamentares e setores do governo refratários ao reajuste reivindicado. Vamos à luta!

 

Apêndice

(A) O reajuste linear de 9% concedido a todos os SPFs da ativa do executivo custou cerca de R$ 11,6 bilhões no Orçamento de 2023[1]. Tal reajuste incidiu sobre 8/13 do ano já que foi aplicado sobre os salários somente a partir de junho de 2023. Mantendo a proporção, se o reajuste fosse de 1% e incidisse sobre todo o ano, o custo teria sido de R$ 2,09444 bilhões. Como esse valor representa 1% da folha de salarial, a despesa no Orçamento/2023 com tal folha seria de R$ 209,444 bilhões sem o reajuste. Passou a ser, contudo R$ 221,044 já com o reajuste. A concessão em 2024 de reajuste de 1% sobre tal montante custaria assim R$ 2,210 bilhões (em valores de junho/2023)

(B) Agora, o reajuste em 2024 de 13,53% sobre a atual folha (de 2023) custaria R$ 29,968 bi e, tudo o mais constante (supondo não haver contratações líquidas, promoções etc.), levaria o gasto total com a folha no Orçamento 2024 atingir os R$ 251,012 bi. E, sucessivamente, o mesmo reajuste de 13,57%: em 2025 sobre a folha de 2024 custaria R$ 34,030 bi (levando o total da folha aos R$ 285,042 bi em 2025) e em 2026 (sobre a folha de 2025) custaria R$ 38,644. Tudo isso sempre em valores de junho/2023.

(C) a taxa de crescimento anual real de 4% dos gastos com Saúde & Educação assumida neste exercício é igual a taxa de crescimento média das receitas líquidas entre 2000 e 2017 pois supõe-se aqui que, dado o aperto fiscal do NAF sobre todas as demais despesas primárias, o governo terá dificuldade de elevar aquelas rubricas acima do mínimo constitucional. Tal taxa é um pouco menor do que a da média de crescimento anual de Saúde e Educação efetivamente ocorrido de 2001 e 2017 (até o ano anterior ao Teto Temer vigorar). Lembrando que durante os governos petistas, essa taxa foi sempre bem maior (superando bem o mínimo constitucional): no Lula I, II e Dilma I (2004-2014), sua média anual foi de 11,7%. Se nos próximos 3 anos, essa taxa anual for maior que 4% (seja por obrigatoriedade constitucional ou por decisão discricionária), o espaço para elevar demais gastos primários (incluindo os com reajustes) será ainda mais limitado do que o previsto no exercício aqui desenvolvido.

(D) Se o NAF limita a taxa crescimento das despesas primárias totais ao máximo de 2,5% ao ano, isso implica em:

2,5% >   wSE,t gSE,t + wFS,t gFE,t + wD,,t  gD,,t                    (1)

Onde:  wSE,t , wFS,t e wD,t são respectivamente os pesos relativos (ao total das despesas primárias) no ano “t” das despesas com Saúde&Educação, Folha Salarial e Demais Despesas Primárias (ou seja, wSE,t = Gasto com Saúde&Educação / Despesa Primária Total e assim por diante); e gSE,t , gFE,t ,  gD,t são respectivamente as taxas de crescimento real no ano “t” de Saúde&Educação, Folha Salarial e Demais Despesas Primárias. Portanto,

gD,t < [2,5% – wSE,t gSE,t – wFS,t gFE,t ] / wD,t                   (2)

Nesta simulação (caso Fonasefe), sabemos que gSE,t e gFE,t são constantes e igual a 4% e 13,53%. Os dados do SIOP (Sistema Integrado de Orçamento e Planejamento do Governo Federal) mostram que em 2023 wSE,t , wFS,t e wD,t são aproximadamente 9,95% e 12,38%; variando anualmente a um fator [(1+ gSE)/(1+2,5%)], [(1+ gFS)/(1+2,5%)] e [(1+ gD)/(1+2,5%)] respectivamente.

Assim, pela inequação (2), sabemos que o gD,t máximo nos próximos três anos será de 0,69%, 0,5% e 0,28%. Ou seja, o crescimento médio anual de todas as demais despesas primárias (excetuando-se Saúde&Educação e Folha Salarial) será no máximo 0,49%.

(E) Pela lógica das regras do NAF, as decisões a respeito das taxas de crescimento das despesas são baseadas no calendário fiscal da PLOA, que vai de julho do ano anterior até junho do ano da aprovação da PLOA (que, por sua vez, deve ocorrer no ano anterior ao da implementação da LOA em si). Por isso, na proposta Fonasefe, ao integrar a inflação de 2023, considera-se a variação do IPCA (estimada) entre 1º de janeiro a 30 de junho deste ano (2,79%).

(F) Aplicando agora ao caso Fonacate (gD = 7,8%) na inequação (2) do apêndice D, verifica-se que o gD,t máximo nos próximos três anos será de 1,42%, 1,37% e 1,32%. Ou seja, o crescimento médio anual de todas as demais despesas primárias (excetuando-se Saúde&Educação e Folha Salarial) será no máximo 1,37%.

(G) Ao caso da limitação do crescimento dos gastos com Folha à taxa dos demais gastos primários – exceto Saúde e Educação -, resolve-se a inequação (1) considerando gFE,t = gD,t. Assim, tem-se que gD < (2,5% – wSE,t gSE)/(1-wSE,t).

[1] Câmara dos Deputados (https://www.camara.leg.br/noticias/950638-projeto-permite-concessao-de-reajuste-de-9-aos-servidores-do-executivo/)