30/06/2024
Comando de Greve Docente Unifesp e diretoria da Adunifesp
Com embate duro, avanços na recomposição salarial e orçamentária mostram que a luta valeu a pena.
1. UNIFESP NA GREVE
A greve nacional docente encerrou-se nesta semana com conquistas significativas, embora parciais – aquém do reivindicado e do necessário às recomposições salariais e orçamentárias. Ela permitiu à categoria docente visibilizar demandas numa conjuntura muito adversa diante da insistência obstinada do governo federal em manter um ajuste fiscal (imposto pelo Novo Arcabouço Fiscal e meta de déficit zero) e em meio a crescentes ataques e ameaças à Universidade Pública perpetrados pelos inimigos dos investimentos sociais, em educação, ciência e pesquisa – do Centrão no Congresso à grande mídia, mercados financeiros e agronegócio ao golpismo bolsonarista.
Nas universidades federais, o movimento grevista iniciou-se nacionalmente no dia 15/04, com a deflagração de greve decidida por dezenas de assembleias docentes e com a formação do Comando Nacional de Greve (CNG) do Andes-SN. Nessa e nas semanas seguintes, 67 Instituições Federais de Ensino Superior da base Andes foram aderindo à greve – uma das maiores da história. Docentes universitários juntaram-se então às greves dos Técnicos Administrativos em Educação (TAEs) e de 80 Institutos Federais (representados pelos sindicatos Fasubra e Sinasefe respectivamente) numa grande Greve da Educação Federal, envolvendo ao todo mais de 200 mil servidores na ativa.
Na Unifesp, docentes decidiram deflagrar o movimento grevista no dia 29 de abril. Mantiveram-na até o dia 23 de junho após deliberarem pela assinatura do acordo com o governo e pelo encerramento da greve em todo o país.
A decisão de saída da greve foi tomada na Assembleia Geral Docente da Adunifesp ocorrida no dia 18/06 por 123 a favor, 8 contra e 30 abstenções. A assembleia decidiu também por delegar ao Comando de Greve da Unifesp com seu delegado no Comando Nacional de Greve (CNG-Andes) a decisão sobre assinar o acordo a depender deste conter integralmente os termos definidos na última reunião de negociação com o Ministério da Educação (MEC) e o Ministério da Gestão e Inovação (MGI). Com a confirmação disso, decidiu-se que a delegação Unifesp na reunião do CNG votaria ali a favor da assinatura do acordo, bem como pelo fim da greve nacional.
A decisão nacional ocorreu em reunião do CNG-Andes do dia 23/06. Ali, partindo-se dos relatos e atas das Assembleias Gerais (AGs) ocorridas nas universidades em consulta sobre a proposta apresentada na mesa de negociação de 14/06: 29 AGs foram favoráveis à assinatura do acordo; 21 contrárias e 11 abstiveram-se ou não chegaram a tomar posição (em parte por não saberem no momento qual seria o teor completo do acordo, já que o MGI demorou mais de uma semana para publicizar a minuta do mesmo). Com base nisso, delegações de comandos locais de greve (CLG) presentes no CNG votaram pela assinatura do acordo (18 a 11, com 6 abstenções). As delegações também decidiram por encerrar a greve coletiva e nacionalmente (22 a 12; 1 abstenção), corroborando também os relatos/atas das AGs (33 a 20 e 9 abstenções).
Docentes dos Institutos Federais, representados pelo CNG do Sinasefe, no mesmo dia também decidiram assinar o acordo (89 a 15 e 6 abstenções) e encerrar sua greve (98 a 6, com 9 abstenções) por ampla maioria. O mesmo acabou ocorrendo na plenária do CNG da Fasubra.
2. VALEU A PENA?
A greve levou à suspensão das atividades acadêmicas em todo o país, não apenas de ensino, mas mesmo parte das pesquisas, das tarefas administrativas e até da extensão – sempre procurando preservar as atividades essenciais. Paralisações trazem consigo, naturalmente, contratempos e reveses à toda comunidade universitária. Mesmo assim, a greve contou com solidariedade e apoio de boa parte dos estudantes. Na Unifesp e na maioria das demais universidades do país, os discentes optaram por organizar suas próprias greves com pautas próprias (verbas da assistência/permanência estudantil, transporte, infraestrutura etc.).
Resistência ao movimento acabaram ocorrendo por parcelas – em geral minoritárias ou ao menos pouco ativas – da categoria docente, já que a descontinuidade do semestre letivo sempre gera tensionamentos. E agora que docentes e alunos terão de repor aulas e demais atividades, perder parte de suas férias, muitos se perguntam se valeu a pena o esforço de mobilização e negociação.
A resposta é inequivocamente positiva: por um lado, a greve trouxe resultados salariais e orçamentários palpáveis que embora modestos não são desprezíveis, por outro ela teve um saldo político e organizativo importante – que deve ter consequências no futuro da luta coletiva em defesa da carreira docente e da própria universidade.
2.1 Saldo político-organizativo, maturidade e combatividade
A greve escancarou na arena nacional (a despeito da má vontade da grande mídia) o debate da disputa pelos fundos públicos para a Educação e Gastos Sociais, contra a especulação financeira e o fiscalismo anti-popular e anti-nacional. Os campi da Unifesp eram um retrato da luta em todo o país: estavam sem aulas, mas nunca pararam durante a greve. Mantiveram atividades abertas trazendo às dependências da universidade centenas de estudantes, TAEs, docentes e população em geral. Um calendário de atividades de greve plural desenvolveu-se por quase dois meses: debates sobre Orçamento das IFES, aulas públicas sobre autonomia universitária e função social das universidades; atividades do movimento negro e LGBTQIA+; debates sobre democracia, ditadura e novos fascismos; sobre crise climática e novas emergências globais; plenárias comunitárias entre as categorias com formulação de pautas e GTs locais; oficinas e atividades culturais; e mobilizações fora dos muros da Unifesp, incluindo encontros, atos, passeatas, caravanas a Brasília etc.
As Associações Docentes (ADs) que impulsionaram a greve tornaram-se uma referência de luta à categoria. Na Unifesp, bem como em todo país, Comandos Locais de Greve passaram a agrupar um número grande de colegas, muitos dos quais iniciaram sua atuação e colaboração com o movimento docente pela primeira vez. Muitos desses docentes representam uma nova geração de ativistas que reforçarão o sindicato. Muitos inclusive se tornarão novos diretores de ADs, que, aliás, têm recebido novas filiações da base.
A ação do CNG caracterizou-se por uma combinação de combatividade e maturidade inéditas na história recente do Andes-SN. Diferente das campanhas salariais de 2008, 2012 ou 2015, a direção do movimento agora, não apenas resolutamente mobilizava na base, mas procurava explicitar interesse em negociar, exigindo do governo que isso ocorresse efetivamente, respeitando as leis vigentes. Nas campanhas anteriores, embora também muito combativas, era comum os CNGs Andes resistirem na flexibilização de itens da pauta reivindicatória original. Tendiam assim a forçar artificialmente um impasse nas Mesas e transformar o movimento numa “greve de resistência”, longa e mais voltada à denúncia pela denúncia (ideológica) do governo do que à obtenção de conquistas concretas (e sindicais) à categoria docente.
Assim, a recusa das antigas direções do Andes em assinar qualquer um dos acordos nas Mesas dos governos Lula e Dilma (de 2008 a 2015) abriu espaço político para a Proifes – entidade pseudo-sindical, de fato atrelada aos ministérios e às alas mais conservadoras das burocracias universitárias – assinar o acordos ao final, distorcendo nos seus termos conquistas da greve (sempre boicotada por seus dirigentes) – impondo por exemplo pioras injustas na reestruturação de carreira, desfavorecendo a dedicação exclusiva (DE) etc.
2.2 Proifes definha e categoria se unifica na luta
Agora, houve um ajuste na ação do CNG-2024 no sentido de melhor direcionar e intensificar a luta e pressão sobre o governo para iniciar e desenvolver a negociação. A cada melhora nas respostas do MGI às pautas da greve, o CNG debruçava-se na elaboração de contrapropostas intermediárias (referendadas pelas AGs de base) mais exequíveis a um acordo rápido. Elevou-se a pressão, tanto pelas bases, como também por setores governamentais executivos via articulações junto a parlamentares, a direções partidárias etc. para empurrar o reticente MGI a seguir com o processo de negociação. Toda essa ação do atual CNG-Andes frustrou tentativas de se utilizar (como no passado) a Proifes como agente abafa-greve, que funcionou como facilitador aos representantes ministeriais a se darem ao luxo de manterem a intransigência negocial e os ultimatos frente à categoria (“se vocês não aceitarem, Proifes assina”).
Nesta greve de 2024, contudo, a Proifes definhou e se desmoralizou: com quase toda a base de suas poucas ADs exigindo desfiliação. Seus dirigentes aliás, viram anulada sua tentativa de assinar acordo rejeitado pela base em 15/05. Esse inequívoco declínio do divisionismo/arrivismo no movimento da categoria docente e a concomitante reafirmação do sindicato nacional, o Andes, como o legítimo e único instrumento de tal movimento é em si parte do saldo político desta greve – com importantes e promissoras consequências às lutas por direitos e conquistas que estão por vir.
2.3 Conquistas econômicas parciais, mas relevantes
É verdade que as conquistas salariais e orçamentárias concretas acabaram por ser menores do que o desejado. A intransigência governamental na negociação e a limitação do movimento ao setor da Educação Federal (sem adesão de demais categorias – o que multiplicaria o poder de pressão da greve) e não permitiria outro resultado; ainda mais na atual difícil conjuntura.
Mas foi a greve – e somente ela – o que garantiu que muitas das demandas fossem alcançadas.
Os reajustes salariais e orçamentários obtidos não teriam sido de modo algum concedidos pelo governo sem que o movimento paredista tivesse ocorrido. E este só logrou tal feito por ter se mantido por dois meses unido, combativo, determinado e – ao mesmo tempo – propenso à negociação. Isso fica claro ao revisitarmos a cronologia da greve, o que faremos a seguir.
3. HISTÓRICO DA CAMPANHA SALARIAL 2024: EVOLUÇÃO DAS CONQUISTAS DA GREVE
A Mesa de Negociação Permanente foi retomada logo após a posse do governo Lula. Ela havia deixado de existir com o Golpe de 2016: Temer e Bolsonaro recusavam-se a negociar com os servidores. Nem tampouco dialogavam com as universidades públicas e suas demandas. Na Mesa, garantiu-se logo de início que os R$ 11,5 bilhões já provisionados na lei orçamentária (LOA) 2023 aprovada pelo Centrão/Bolsonaro fossem usados a um reajuste linear de 9% em maio/2023 a todos os Servidores Públicos Federais (SPFs) – e não privilegiadamente a policiais, como intencionava Bolsonaro. Tal reajuste, mesmo insuficiente, foi aceito pelos sindicatos de SPFs apenas como medida emergencial e preliminar.
Em julho de 2023 os trabalhos da Mesa, agora voltados para 2024 em diante, foram reabertos. O Fonasefe (Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais) lembrou o representante do MGI, José Feijóo que mesmo com o 9% obtido em maio, a recuperação de perdas salariais desde 2011 exigiria quase 40% de reposição. No mês seguinte, contudo, o governo envia seu projeto de Novo Arcabouço Fiscal (NAF) em substituição ao famigerado “Teto dos Gastos” de Temer (EC-95). Embora um pouco menos draconiano do que o “Teto”, o NAF mantém contudo o país prisioneiro do fiscalismo limitador de verbas aos serviços públicos e à recuperação salarial de SPFs.
3.1 Governo recusou negociar por oito meses
Em setembro de 2023, ao iniciar os trabalhos da Mesa, o governo avisou que, devido aos limites do NAF, não poderia conceder mais do que um esquema mínimo de reposição salarial de 9% ao todo: 0% em 2024 e talvez (se as receitas crescessem e as regras do NAF permitissem) duas parcelas de 4,5% – em maio de 2025 e de 2026. O que faria com que valor real (descontando a inflação esperada no Lula III) dos salários no final de 2026 estivesse quase igual ao do final de 2022! Ou seja, a recomposição salarial das perdas acumuladas seria zero.
Em novembro, o MGI desmembra a Mesa geral em Mesas Específicas para cada categoria – numa ação que muitos consideraram voltada à divisão do movimento dos SPFs. Assim, aliás, que o MGI concede reajuste muito maior a Policiais Federais e algumas outras poucas categorias (Banco Central, Auditores Fiscais etc) que ameaçaram greve e nada comparável ao restante dos servidores. Sentindo-se injustiçados, demais SPFs (incluindo docentes organizados pelas ADs do Andes-SN) protestaram e intensificaram exigências por verdadeira negociação.
Desprezando-os, contudo, o governo na virada do ano reiterou e formalizou a eles o pífio esquema até 2026, incluindo apenas uma reposição parcial de benefícios: além de reajuste de 9% (0% em 2024), o MGI propôs apenas reajustar alguns benefícios: o vale alimentação (de 658 a 1 mil reais); e os Auxílios Saúde (de 144 a 215 reais por beneficiário) e Creche (de 325 a 425 reais respectivamente). Benefícios, aliás, que só atingem parte dos SPFs da ativa e deixa aposentados na mão. Mesmo assim estes reajustes ainda os mantém muito inferiores aos dos servidores dos poderes Legislativo e Judiciário.
O Fonasefe rejeita a proposta. Mas num sinal de disposição em negociar, ao invés da inicial de reposição de 40% (perdas desde 2011), protocolou já nos primeiros dias de 2024 uma contraproposta: reposição das perdas apenas ocorridas nos governos Temer e Bolsonaro. O que, já descontando o 9% reajustado em maio/2023, significaria 22,7% em 3 parcelas de 7% anuais. Além disso, seguiu exigindo equiparação dos benefícios com os demais poderes e o “revogaço” de alterações na legislação que precarizavam o trabalho docente e aposentadorias.
O MGI, contudo, desconsiderou por completo a contraproposta. Apenas repetia monotonamente, rodada após rodada das Mesas Específicas, sua sugestão de pífio reajuste (9%). Manteve-se assim inflexível entre setembro 2023 a abril 2024 – demostrando na prática sua indisposição em negociar efetivamente com a maioria dos SPFs.
Enquanto isso, com a mesma intransigência, o MEC seguia mantendo o Orçamento das IFES/2024 com R$ 300 milhões a menos do que em 2023 – ou R$ 2,8 bilhões inferiores ao orçamento de 2017 (atualizado monetariamente). Algo que tornava cada vez mais insustentáveis as condições de trabalho da docência (laboratórios sucateados, bolsas cortadas, evasão de alunos e cursos por cortes na assistência e permanência etc.). Lembrando que MEC e MGI seguiam postergando resolver (ou sequer assumir compromissos) frente a pauta não-remuneratória: revogação de medidas anti-trabalhistas e anti-universidade dos governos Temer e Bolsonaro.
3.2 Paciência tem limite: ano letivo começa com disposição de greve na base
A inconformidade e a revoltante frustração com tal recusa do governo em negociar – e a ausência de perspectivas de diálogo com autoridades – acabou gerando um sentimento favorável à greve na comunidade acadêmica logo na abertura do ano letivo. No Congresso do Andes (fevereiro/2024) a proposta de construir as condições a uma possível greve era unânime (a diferença entre delegações e forças políticas dizia respeito apenas aos ritmos, prazos e condicionantes de tal construção). Para a surpresa de muitos, as primeiras assembleias do ano (em março) realizam-se com enorme participação da base – com amplo quóruns e debates animados como há muito não se via.
Era a mesma base, aliás, que havia se engajado dois anos antes, junto com a classe trabalhadora mais conscientizada, na campanha para derrotar Bolsonaro (elegendo Lula – para “colocar o povo no Orçamento” e defender a Universidade contra sua destruição) e que, com isso, ganhara mais confiança em sua capacidade de mobilização e luta. Além de compreender que esse era o momento de reparação histórica das perdas e ataques que sofremos nos anos em que universidades lutaram na pandemia contra o negacionismo, a desinformação e o obscurantismo.
É nesse ambiente que se dá a deflagração da Greve da Educação Federal. Em março de 2024, TAEs iniciam a greve nacional da Fasubra. Em abril, é a vez de docentes dos IFs e, na sequência, das Universidades.
3.3 Força da greve e persistência dos comandos de greve forçou governo negociar
Foi o crescente e contaminante movimento grevista – e apenas ele – que forçou o governo a finalmente negociar, ainda que lenta e renitentemente.
A estratégia governamental com o início da greve era marcada pela morosidade na negociação, visando desgastar e cansar os ativistas e organizadores nos Comandos. A lentidão para aceitar marcar novas reuniões da Mesa, os múltiplos (e desrespeitosos) adiamentos de reuniões previamente agendadas, a demora para responder (aos dirigentes sindicais) simples requisições ou confirmações e as promessas anunciadas, mas nunca cumpridas – não há como não concluir (ou ao menos desconfiar) que isso era parte de uma guerra de nervos contra grevistas, objetivando gerar a cizânia no movimento e multiplicar tensionamentos entre a base (preocupada em salvar o calendário acadêmico) e as lideranças do movimento. Mas a renitência e a força da greve, que crescia e ganhava apoio popular com o passar das semanas, e as pressões políticas que ela passou a exercer no seio do próprio governo, obrigou-o mais adiante a flexibilizar, negociar e finalmente aceitar fazer concessões inicialmente não admitidas.
3.4 Passo a passo da negociação
I. Na semana do início da greve dos TAEs (Fasubra), em março/2023, às pressas o MEC promete uma suplementação de cerca de R$ 200 milhões no Orçamento das IFES de 2024.
II. Uma semana após o início da greve dos docentes universitários (e na sequência da caravana a Brasília de 17/04), o presidente Lula faz o MGI atender o pedido dos CNGs do Andes e do Sinasefe de antecipar (de meados de junho) para 19 de abril a reunião da Mesa Específica Docente. Em tal rodada emergencial, Feijóo oferece um esquema um pouco melhorado de reajuste linear:
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- 9% em 2025 (antecipando tal parcela de maio a janeiro) e 3,5% em maio de 2026. No acumulado total (até o final do governo Lula III), o reajuste saltaria (da pífia proposta de 9,2%) para 12,8%;
- sugere (sem confirmar) a possibilidade de elevar o step (entre classes/níveis da carreira) de 4% a 4,5%.
Considerando tal contraproposta ainda muito insuficiente, as AGs rejeitam-na enquanto a greve docente crescia com adesões de dezenas de universidades (a greve na Unifesp é deflagrada na semana seguinte).
III. No início de maio, com um forte e ininterrupto crescimento da greve nacional, o MGI apresenta em mais uma reunião extraordinária sua nova proposta:
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- mantém o 12,8% linear anterior;
- inclui um arremedo de reestruturação de carreira (sugerida em parceria com Proifes) a pretexto de ofertar reajustes complementares, mas que são díspares a cada segmento da carreira (reestruturação MGI/Proifes);
- aceita algumas pautas não-remuneratórias, algumas muito relevantes à carreira do Ensino Básico Técnico e Tecnológico (EBTT), por exemplo, o fim da assinatura eletrônica de ponto via revogação do decreto nº 1590/1996 que ajuda indiretamente a impedir que haja tentativas desta exigência chegue algum dia ao Magistério Superior) e a revogação da Portaria no 983/2020 que regulamenta as atividades docentes, no âmbito da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica;
- num ultimato, exige que tais pontos sejam o acordo final a ser aprovado.
Mas nas AGs, a base docente rejeita tal acordo por considerá-lo injusto e divisionista já que reajusta mais o salário de uma minoria e bem menos o da maioria. Com base nisso, o CNG-Andes apresentou uma contraproposta demonstrando disposição à negociação.
IV. Em 15 de maio, contudo, Feijóo rejeita reunir-se com a Mesa de representantes dos CNGs do Andes e do Sinasefe, quando estes explicavam não poder assinar sua proposta de acordo já que todas as assembleias de mais de 100 instituições federais (exceto duas) rejeitaram-na e aprovaram as contrapropostas. Feijóo recusa receber e apreciar tais contrapropostas e proclama unilateralmente o fim da negociação. Indo a outra sala, secretamente, assina acordo com o minúsculo Proifes, que não tinha qualquer respaldo de sua própria base e nem sequer carta sindical (!). Um ataque sem precedentes à legitimidade e à democracia sindical em flagrante desrespeito a várias convenções da OIT.
Quando o acordo foi suspenso na Justiça dada a assinatura da Proifes não valer, Feijóo apressou-se em “resolver” o problema mandando o ministério do Trabalho presentear esta federação com uma carta sindical (algo que, em geral, leva um processo extremamente burocrático e lento – mas, que foi emitido neste caso em poucos dias!). Esquentou a chapa dos pelegos, conferindo-lhes o direito agora de assinar o acordo.
Em resposta a tais ataques, contudo, assembleias docentes em todo o país não apenas mantiveram, mas reforçaram a greve (com novas adesões) e intensificaram ações exigindo reabertura de negociação. Mesmo muito cansados, docentes em greve decidem esticar por mais três semanas seu movimento para numa última (e talvez arriscada) tentativa desmontar o golpe do Proifes e tentar arrancar ao menos alguma conquista a mais.
O esforço produziu resultados.No início de junho, o governo, muito contrariado, se vê obrigado a ceder. Aceita reabrir negociações com os CNGs Andes e Sinasefe.
V. Em 10 de junho, Lula e ministros reúnem-se com reitores: em meio a discursos e reapresentações de projetos já há quase um ano anunciados, o governo federal acaba garantindo quase R$ 300 milhões de verbas novas de custeio (totalizando 500 milhões, quando somado à parcela já prometida – (1) – por Camilo em março) à suplementação de Custeio e algo a mais no plano de obras do PAC da Educação, enfatizando que isso era para garantir que a greve acabasse.
VI. Em 14 de junho, uma reunião conjunta MEC/MGI com os CNGs Andes e Sinasefe fecharam finalmente um acordo com algumas novas concessões (pequenas, mas politicamente importantes):
a) Pauta não remuneratória:
- Isonomia a docentes EBTT e MG quanto a controle de frequência (fim de ponto eletrônico aos EBTTs) via alteração no Decreto 1590/1996.
- Compromisso de revogação completa da IN-983/2020 (de Bolsonaro, que elevava a carga horária de ensino aos EBTTs)
- Criação de Grupo de Trabalho composto por Andes/Sinasefe e MGI/MEC para elaborar os termos finais das alterações legais/infra-legais sobre:
- Reenquadramento de aposentados;
- Entrada lateral (quem é transferido de uma IFES a outra tem garantido carregar a carreira consigo);
- Revogação da IN 15/2022 que inibia o acesso ao adicional por insalubridade e foi implementada no governo Bolsonaro.
b) Pauta remuneratória:
- O reajuste de 2026 foi antecipado para abril.
As conquistas adicionais são modestas, mas não desprezíveis, sobretudo se o GT funcionar e garantir a implementação das medidas pendentes.
Uma ampla maioria é formada nos CNGs Andes e Fonasefe. O movimento havia atingido já o seu ápice quantitativo: quase todas as IFES já estavam paralisadas e mobilizadas, essencialmente não havia mais como fazer a greve crescer. Ultrapassara também seu limite qualitativo: a capacidade de luta e o fôlego dos comandos e de seus ativistas havia já atingido a exaustão – após dois meses de intensas atividades e com as tensões na base da categoria, pressionadas pela quebra prolongada das atividades acadêmicas. Nesse quadro, mesmo sem conquistas mais amplas, a decisão mais adequada não podia ser outra que não o encerramento da greve.
O quadro acima mostra a evolução das conquistas desta campanha salarial docente. Fica evidente que mesmo com o atendimento apenas parcial das demandas, o movimento grevista foi essencial para conquistá-las.
3.5 A luta continua, exemplos a serem seguidos
A greve 2024 da Educação Federal foi o primeiro grande enfrentamento contra o novo arcabouço fiscal de um segmento importante da classe trabalhadora brasileira (mais de 200 mil docentes e TAEs – com o apoio engajado da juventude estudantil). Ele não obteve uma vitória total , mas tampouco sofreu qualquer derrota. Arrancou conquistas parciais e mostrou o caminho a ser trilhado em futuras lutas ao conjunto dos trabalhadores, aos sindicatos, movimentos e partidos de esquerda. Só a mobilização das categorias com o apoio do povo por suas demandas permite abrir um caminho para o seu atendimento.
Denunciamos e rejeitamos veementemente a atitude da direita e extrema-direita que – sempre contrários à greve, aos servidores e serviços públicos – tentaram surfar na onda para atacar a universidade pública e requentar suas tentativas de golpe contra o atual governo. E também rejeitamos a postura dos docentes “ultra-governistas”, que não reconhecem a autonomia da nossa categoria e a legitimidade das reivindicações, querendo atrelar o movimento docente, cooptá-lo ou coagi-lo, de forma a assimilarmos, quietos, a nova regra fiscal. O instrumento de manobra que foi realizado nesse intuito pelo Proifes foi amplamente fracassado. E ficou visível que sem a mobilização dos trabalhadores, o governo Lula está sendo puxado cada vez mais para a direita, refém do Centrão e da Faria Lima.
Pressionar o governo para atender nossas reivindicações (adotando políticas mais à esquerda) não é enfraquecê-lo. Ao contrário, tal pressão ajuda a combater os golpistas da direita, o patrimonialismo e o rentismo. A greve da Educação, aliás, fez o mesmo que o movimento das mulheres nas duas últimas semanas, no caso do PL 1904 (contra as meninas, a favor do estupro). O governo estava calado, disposto a deixá-lo passar, imaginando ser caso perdido e sempre com medo de enfrentar a direita golpista. O movimento das mulheres, entrou em campo, pressionou o governo (forçando-o a sair de sua postura covarde e passiva) e virou o jogo.
Ambas as lutas devem ser exemplos a serem seguidos.
A greve docente se encerrou, mas as lutas pelo orçamento das universidades, pela melhora na carreira e nos salários da categoria docente seguirão nos próximos meses e anos.