Abril 2021, Confederação dos Trabalhadores do Serviço Federal – Condsef
O governo Bolsonaro enviou ao Congresso Nacional a PEC 032/20, a chamada “Reforma Administrativa”. Essa “reforma” vem na linha do desmonte dos serviços públicos, contido na EC 95, Plano Mais Brasil, PECs 186, 187 e 188. Serão necessárias ações efetivas para derrotar essa “reforma” que ataca brutalmente os direitos dos servidores federais, estaduais e municipais(atuais, futuros e aposentados) e pretende sucatear e desmontar os serviços públicos que são do interesse de todo o povo trabalhador.
Além de forjar a unidade de todos os servidores, é preciso dialogar e ganhar os setores da população que dependem dos serviços públicos para a luta contra a reforma que une Guedes e Arthur Lira na linha do “estado mínimo”. O conjunto do movimento sindical a começar pelas entidades dos servidores das três esferas, em particular a CUT, deve engajar suas forças na luta pelo Não à reforma administrativa, agindo em defesa própria, pois são os trabalhadores de suas bases que precisam de mais e melhores serviços públicos, como a própria pandemia demonstrou.
Apresentamos essa cartilha como forma de ajudar neste combate!
Dez perguntas sobre a Reforma Administrativa (PEC-32) de Bolsonaro
O governo Bolsonaro tenta aprovar no Congresso sua proposta de Reforma Administrativa, a PEC-32. Com pressa, ele já fez ela passar pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Assim que retornarem do recesso (no início de agosto), as lideranças governistas tentarão aprova-la a toque de caixa. A PEC-32 é o maior ataque aos serviços públicos brasileiros. Resumidamente, ela:
– Facilita a quebra da estabilidade no emprego dos servidores;
– Proíbe a progressão e a promoção com base apenas em tempo de serviço;
– Proíbe licença-prêmio, licença-assiduidade ou por tempo de serviço;
– Elimina as cotas de cargos que deveriam ser ocupados apenas por servidor e servidora de carreira;
– Permite que, por motivação político-partidária, comissionadas e comissionados sejam destituídos, mesmo que tenham ingressado via concurso;
– Amplia a atuação dos cargos de livre provimento em funções estratégicas, técnicas e gerenciais;
– Acaba com o Regime Jurídico Único;
– Dá ao presidente da República plenos poderes para extinguir, por decreto, cargos, planos de carreiras, colocar servidor em disponibilidade e extinguir órgãos, inclusive autarquias;
– Coloca como referência o salário dos novos servidores e servidoras. Como o salário de ingresso será reduzido, legitima o congelamento salarial a longo prazo, sob alegação de disparidade salarial;
– Veda a redução de jornada sem a correspondente redução de remuneração, exceto se decorrente de limitação de saúde
Apresentamos a seguir algumas perguntas e respostas sobre a Reforma Administrativa.
1) É verdade o que a reforma administrativa é necessária para o Brasil voltar a crescer e que ela vai corrigir injustiças, conforme diz o governo e a mídia?
Não. O que o governo propõe, na PEC 32/2020, é a desorganização do serviço público, tirando do Estado atribuições fundamentais no atendimento à população e abrindo espaço a privatizações de áreas essenciais, entrega da saúde e da educação para Organizações Sociais, fim dos concursos públicos para grande parte dos cargos, apadrinhamento no preenchimento das vagas e quebra da estabilidade facilitando a perseguição política e a pressão das chefias para cumprimento de ordens indevidas ou ilegais.
A reforma é mais uma disputa pelo orçamento público, a exemplo da Emenda Constitucional 95/2016 que congelou o orçamento para os serviços públicos por 20 anos. Entre atender à população – com um projeto de ampliação e melhoria da educação, pesquisa e saúde – e destinar uma parcela maior do dinheiro público para empresários e bancos, o governo escolheu a segunda opção.
Com o golpe de 2016, o governo Temer e depois Bolsonaro aprovaram medidas que, segundo eles, fariam o Brasil voltar a crescer: teto de gastos (EC 95/2016), terceirização geral; reforma trabalhista; reforma da Previdência. Nenhuma delas resolveu; pelo contrário, aumentaram os ganhos dos mais ricos e empobreceram a grande maioria da população.
É certo que várias distorções foram* criadas para acomodar os interesses das cúpulas dos poderes, não são poucos os casos de remunerações que ultrapassam em muito o teto do funcionalismo, mas essa reforma não mexe em nada disso. Ao contrário, tende a aumentar ainda mais a diferença entre os menores e maiores salários.
2) Com a PEC, serviços públicos como Saúde e Educação seguem sendo obrigação do Estado e direito da população?
Não. A PEC 32/2020, de Bolsonaro e Guedes, introduz entre os princípios da administração direta e indireta descritos no Art. 37 da Constituição Federal o da subsidiariedade. Ou seja, o estado passa a ser complementar ao que o setor privado não pode ou não quer atender.
Mesmo que seja apenas um princípio constitucional, nos planos do governo para a reforma já constam mais duas etapas para sua implementação onde esta mudança pode ser realmente aplica- da. Portanto, esse princípio antecipa o objetivo de substituição de escolas, universidades, hospitais e postos de saúde públicos pela entrega de vouchers (vale-mensalidade, vale-educação, vale-creche, vale-saúde) ou mesmo a entrega da administração, contratações e compras para as chamadas organizações sociais lucrarem em cima do que deveria ser direito do povo.
A população precisa de mais e melhores serviços públicos, e não menos.
3) A propaganda oficial fala que somente os novos servidores serão atingidos. Isso é verdade? Como ficam aposentados e pensionistas?
Não. A reforma atinge todos, novos e futuros. Ativos e aposentados. Mesmo que num primeiro momento somente os novos não teriam direito à estabilidade, os atuais seriam submetidos a avaliações de desempenho subjetivas. Na medida em que os novos estariam submetidos a todo tipo de pressão, pois não teriam estabilidade, os atuais seriam submetidos a avaliações de desempenho com critérios subjetivos que permitirão avaliações com cunho ideológico por parte da chefia de plantão, acarretando, certamente, perseguições, em especial a quem defenda os direitos coletivos e individuais.
A atual legislação já prevê a demissão dos servidores estáveis, mas o que o governo busca na verdade é um instrumento de pressão e ameaça permanente.
4) Se a PEC-32 for aprovada, quais carreiras teriam direito a estabilidade?
O que a PEC faz é instituir cinco modalidades de contratação, onde somente uma teria direito a estabilidade. Todas as demais – a esmagadora maioria – perdem esse direito. O texto da reforma recria o entendimento de “cargo típico de Estado”, adotado na ditadura militar, para diferenciar servidores e servidoras que continuariam a ter estabilidade. Os critérios para determinar o que são “cargos típicos de Estado” serão estabelecidos por lei complementar. Isso deve levar o desmonte da estrutura de serviços públicos essenciais, como Saúde e Educação, que não estarão protegidos.
5) A ameaça de redução de salários continua?
Sim. Ao vedar a redução de jornada sem a correspondente redução de remuneração “exceto se decorrente de limitação de saúde”, a PEC-32 sugere que poderá haver redução de jornada com redução de remuneração de forma compulsória. O texto também afirma que “É vedada a redução da jornada e da remuneração para os cargos típicos de Estado”. No entanto, deixa sem essa garantia todos os demais; lembrando que é política do governo (foi colocado em outras PECs) a redução salarial a pretexto de “redução de despesas”. Ademais, o salário de ingresso será reduzido. Portanto, ao colocar como referência o salário dos novos servidores e servidoras, a reforma legitima o congelamento salarial em longo prazo, sob alegação de disparidade salarial.
6) É verdade que “o número de servidores no Brasil é exagerado”, e que – “marajás” – eles ganhariam muito mais que a iniciativa privada, como repete diuturnamente a grande imprensa?
É falso! O funcionalismo (federal, estadual e municipal) no Brasil corresponde a 12,5% da po- pulação empregada. Esse número fica abaixo da média de países tipicamente capitalistas como Estados Unidos (15,89%), e os latino americanos, cuja média é de 17,88%. Saúde e educação concentram o maior número de servidores. Cerca de 35% do funcionalismo no país está empregado nessas duas áreas.
Quanto a seu rendimento, em média, eles ganham 8% mais do que no setor privado se exercessem funções similares. Lembrando, contudo, que é exigido do servidor: concurso público, escolaridade, conhecimentos gerais e específicos de sua área de atuação e capacitação permanente para atuar no serviço público.
Mesmo assim, metade do funcionalismo público no Brasil ganha até de R$ 2,9 mil por mês (isso sem contar os descontos). Segundo dados de 2018, a maior parte dos funcionários públicos (57%) tem rendimentos concentrados na faixa de até 4 salários mínimos, ou seja, de R$ 3.816,00. Nos municípios, que concentram 56% de todo o funcionalismo no país, 73% estão nessa faixa salarial.
7) Quais os riscos de tirar da Constituição artigos relativos aos serviços públicos e ao funcionalismo?
Para mudar a Constituição, são necessárias votações em dois turnos no Senado e na Câmara, com garantia de três quintos dos votos em cada uma delas. Se as obrigações do Estado em garantir a prestação de serviços e o atendimento de necessidades da população em áreas fundamentais como saúde, educação e saneamento não estiverem na Carta Magna, fica muito mais fácil para os governos de plantão simplesmente não destinarem verbas.
Diminuir a presença do Estado no fornecimento de bens e na prestação de serviços e programas sociais e reduzir o número de servidores, atribuindo à iniciativa privada que atenda a essas necessidades, desregula a prestação dos serviços, diminui a possibilidade de fiscalização e, futura- mente, pode fazer com que um direito fundamental não seja mais reconhecido enquanto tal.
8) Juízes, desembargadores, promotores, procuradores e militares serão atingidos?
Não. A reforma não atinge magistratura, procuradores e promotores. Nem militares. Todos eles são os servidores cujos privilégios são os mais recorrentes- sempre obtendo vantagens (apenas a eles) que servem para assegurar pagamentos acima do teto do funcionalismo.
Guedes já anunciou seus planos para a cúpula dos poderes. Sob o argumento de que “temos
que ser mais meritocráticos”, o ministro afirmou, referindo-se a casos como o da Presidência da República e do Supremo Tribunal Federal (STF), que “é evidente que eles têm que receber muito mais do que recebem hoje”. Atualmente, os ministros do STF recebem o teto de R$ 39,2 mil por mês, mais muitos penduricalhos.
Em sua fala, Guedes disse que é preciso existir uma “enorme” diferença entre os salários dos
ministros e dos demais servidores. Ele citou como exemplo o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas: “O Bruno Dantas, em qualquer banco, vai ganhar 4 milhões de dólares por ano. É difícil convencer o Bruno a ficar no TCU porque ele vai receber várias propostas do setor privado”.
Os militares tampouco entram na reforma. Ao contrário, ela até amplia, por exemplo, a possibilidade de acumulação de cargos civis por militares (aí incluídos policiais militares e bombeiros militares), notadamente no magistério. Os militares já foram poupados na reforma da previdência e não param de acumular vantagens no governo Bolsonaro.
9) A reforma diminui os cargos em comissão e a possibilidade de indicações políticas para exercer funções nos serviços públicos?
Pelo contrário! As funções de confiança, os cargos em comissão e as gratificações de caráter não permanente, que atualmente podem ser exercidas apenas por servidoras e servidores efetivos, serão gradualmente preenchidas pelos “cargos de liderança e assessoramento”. Esses cargos, cujos critérios de acesso serão determinados pelo chefe de cada Poder (ou seja, abre-se totalmente espaço para concepções pessoais, políticas, religiosas etc. em vez de critérios técnicos), poderão ser destinados a “atribuições estratégicas” ou “técnicas”, ou seja, essas funções deixam de ser exercidas exclusivamente pelo pessoal concursado. Ademais, o fim da contratação por Concurso Público, será um grande incentivo ao “cabide” de emprego generalizado.
10) Quais outras proibições da reforma?
– Aumento de remuneração ou de parcelas indenizatórias com efeitos retroativos;
– Adicionais referentes a tempo de serviço ou indenização por substituição,
– Progressão ou promoção baseada exclusivamente em tempo de serviço;
– Parcelas indenizatórias sem previsão de requisitos e valores em lei;
– Incorporação da remuneração de cargo em comissão, função de confiança ou cargo de liderança e assessoramento ao cargo efetivo ou emprego permanente.;
– Recebimento de retribuição de posto comissionado, gratificações de exercício, bônus, honorários, parcelas indenizatórias, entre outras, para quem se licenciar para estudar, acompanhar parente doente ou exercer mandato sindical e político.
*A Adunifesp agradece à Condsef por tornar de uso público sua apostila sobre a PEC-32, com base na qual este artigo foi baseado.