Estudantes reivindicam políticas adequadas de permanência

Um jovem que para de estudar e abandona uma vaga em universidade pública – por falta de moradia, alimentação, assistência ou transporte – representa um custo muito maior para o governo do que o investimento necessário para mantê-lo estudando. É praticamente consenso entre especialistas e movimentos sociais ligados à educação que o prejuízo com a evasão ou o baixo rendimento nos estudos, por falta de ações adequadas de permanência estudantil, é muito maior do que o investimento em tais políticas.

Apenas em 2010, seis anos após o início da expansão das universidades, o Governo Federal tomou uma medida concreta sobre o assunto, assinando o Decreto 7234/2010, que cria o Programa Nacional de Assistência Estudantil. Mesmo assim, o projeto ainda não prevê recursos orçamentários imediatos e a tendência das condições de permanência estudantil é piorar nos próximos anos, com a continuidade da expansão e o ingresso nacional unificado, através do Enem, o que deve aumentar o deslocamento de estudantes por todo o Brasil.

Dentro deste cenário difícil, o caso da Unifesp é dos mais críticos. A Instituição realiza uma rápida expansão, mas não consegue responder adequadamente as demandas do processo, entre elas a política de permanência. Um auxílio que pode chegar a 300 reais por estudante – para cobrir moradia, alimentação e transporte – tenta melhorar a questão, pelo menos enquanto políticas mais consistentes não existem. Entretanto, é consenso entre os estudantes entrevistados que, além do valor ser insuficiente, o processo de seleção é rigoroso e burocrático, causando exclusão e atrasos na concessão dos benefícios. O problema da falta de moradia estudantil, que já existia mesmo antes dos novos Campi, agora é gravíssimo. Nunca é demais lembrar que a Unifesp é uma das pouquíssimas federais que não tem um alojamento próprio.

Santos

O Campus da Baixada Santista é provavelmente o mais vulnerável à falta de permanência estudantil. O bairro da Ponta da Praia, local do prédio principal, é uma área nobre, tornando habitação e alimentação caras para os estudantes. A situação ainda deve piorar no futuro com a especulação imobiliária causada pelo pré-sal e a modernização do Porto de Santos. Muitos acabam obrigados a morar longe, alguns em municípios vizinhos como São Vicente e Guarujá. Segundo um grupo de alunos do curso de psicologia, o custo de vida estaria causando evasão e trancamento de matrículas.

Os estudantes também criticam o valor do auxílio financeiro da Unifesp, afirmando estar fora da realidade de Santos. O programa apresentaria dificuldades de acesso aos benefícios, com a seleção excluindo muitos candidatos sem normas claras. O processo exige, entre outros documentos, comprovantes de renda de pai e mãe. Um aluno órfão ou que vive com outros familiares, por exemplo, estaria automaticamente fora. Outro agravante é a impossibilidade de acesso por estudantes que trabalham. Além disso, este ano o dinheiro atrasou vários meses, o que para quem precisa pagar aluguel e condomínio é bastante grave. Alugar moradias também é tarefa árdua. As imobiliárias em geral não aceitam jovens e exigem muitos documentos.

O transporte entre os prédios é outro problema grave. Os alunos assistem aulas em dois deles, não há uma linha circular e o ônibus municipal custa 2,50. Existe ainda um terceiro prédio onde se encontra o Núcleo de Apoio ao Estudante (NAE) e a assistência à saúde, distante 40 minutos da Ponta da Praia, o que faz com que seja mais prático o atendimento em um pronto-socorro comum. Além disso, um estudante do período noturno que trabalhe de dia não teria acesso aos serviços do prédio, que só funciona até às seis horas. “À noite a estrutura da universidade praticamente não funciona”, reclama uma discente.

Diadema

Em Diadema, uma diretora do Centro Acadêmico avalia que não há um planejamento da Instituição sobre as necessidades dos alunos, principalmente os ingressantes. “Os estudantes do interior de São Paulo, por exemplo, reclamam de total falta de informação”, diz. “A evasão por falta de assistência existe”, afirma a discente – caloura do curso de Ciências Ambientais – que constata que colegas de sua sala já abandonaram o curso. Ela também reclama que o acesso aos auxílios é insuficiente e que muitos candidatos desistem por dificuldades em conseguir a documentação exigida.

A falta de moradia universitária é uma das principais críticas no Campus. “Há alunos que precisam se locomover de Jundiaí ou da Baixada Santista diariamente”, diz uma aluna, que também expõe a dificuldade de encontrar imóveis bons e baratos na cidade. Uma estudante do curso de farmácia relata que vai diariamente do Bairro do Piqueri – na zona norte de São Paulo – para Diadema, tomando seis conduções e gastando mais de três horas para ir e voltar. Mesmo com passe estudantil, precisa de mais de dez reais diariamente. “Tem professor que passa a lista mais cedo no período noturno porque há estudantes que precisam ir embora”, relata.

O transporte entre os prédios do Campus também dificulta a vida dos estudantes, já que não há linha circular. Em reunião, o diretor administrativo local prometeu dois microônibus cobrindo o trajeto para o segundo semestre. Atualmente, para chegar ao prédio do Eldorado, onde estão os laboratórios e o NAE, um estudante leva 30 minutos e gasta 2,50 com a passagem municipal.

Guarulhos e SJC

Uma assembléia convocada em junho pelos Centros Acadêmicos de Guarulhos debateu as dificuldades enfrentadas pelos estudantes no dia a dia. “Bicho na salada, água amarelada com gosto de cimento, o prédio cheio de problema, a biblioteca que não tem o livro que a gente precisa”, reclamou ao microfone um estudante mais crítico, que ainda afirmou que as respostas da administração seriam sempre burocráticas. “Sem transporte, sem moradia e condições básicas não têm como encaminhar os estudos”, afirmou outro discente, com um forte tom de indignação.

Localizado no bairro dos Pimentas – afastado do centro de Guarulhos – o acesso ao Campus é bastante difícil aos estudantes que moram em São Paulo e outras regiões. O ônibus que vai do Metrô Armênia até a Unifesp, além de ser precário e superlotado, custa absurdos 4,25. O problema do acesso é ainda maior para o estudante trabalhador que na maioria das vezes se locomove no horário de pico. A Reitoria tenta melhorar a situação, negociando com a EMTU uma linha entre o Metrô Itaquera e o Campus, mas ainda não há perspectivas.

Por último, em São José dos Campos, a principal reclamação é quanto ao acesso limitado aos auxílios financeiros. Segundo um grupo de estudantes, apenas dez, dos cerca de quatrocentos discentes estariam sendo contemplados. Como o Campus está todo concentrado no mesmo local e fica em uma região menos central da cidade, o transporte é menos problemático e a moradia não é tão cara. Mesmo assim, com um número pequeno de benefícios e a perspectiva de grande crescimento do número de alunos nos próximos anos, pode piorar bastante a situação.

A Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis, uma das principais conquistas da reforma do Estatuto concluída este ano, pode cumprir um papel importante na superação dos diversos problemas relacionados à permanência. Mesmo não tendo sido aprovada a proposta original feita pelos estudantes, sem dúvida representa um avanço. A partir de agora, a Instituição contará com uma Pró-Reitoria e um Conselho para se debruçar exclusivamente sobre as principais questões estudantis, em particular sobre as políticas de permanência.