Editorial: Um rastro de migalhas ideológicas no “novo” Plano Nacional de Educação

O conjunto de metas do Plano Nacional de Educação (PNE 2014–2024), estabelecido em 25 de junho de 2014 pela Lei 13.005, oferece nova amostra do poder de manobra das forças políticas envolvidas no sentido de ratificar seus projetos de desmonte da educação pública e, assim, colher seus benefícios privados. O PNE deverá direcionar as políticas públicas no próximo decênio no sentido:
1. De haver uma ampliação progressiva da parcela do PIB para a educação, partindo dos atuais 5,3% para chegar a um mínimo de 7% no quinto ano de vigência da lei e a 10% do PIB ao fim do período de dez anos.
2. Da erradicação do analfabetismo.
3. Do incentivo à formação de professores.
4. Da ampliação na oferta de Educação Integral e Infantil.
5. Da obrigação da União complementar recursos para atingir o Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi), cálculo que considera: jornada de aula, número de alunos por turma, valorização docente e infraestrutura.

A necessidade é emergencial (e no Brasil isso não é pleonasmo), mas, no jargão do planejamento político estratégico, a ampliação do percentual do PIB tem de ser homeopática, ou, nos dizeres do PNE: progressiva. A erradicação do analfabetismo é bandeira lendária de qualquer governo, mas aqui funciona como rubrica politicamente correta a ser empunhada oportunamente em ano eleitoral para exprimir a boa intenção que carrega. Mas entre essa “meta” e aquela que poderia garantir materialidade efetiva para combate do analfabetismo, surge um eufemístico “incentivar” a formação dos professores, o que de tão vago pode conter desde uma mera intenção até “abrir mais vagas”, mas nunca algo que sequer tocasse em algum dos nervos do problema como, por exemplo, os salários.

Os itens 4 e 5 são, por isso também, essencialmente nuvens de fumaça. Ampliar as vagas na educação infantil com qualidade significa atacar o que não querem mexer. Critérios de qualidade sem valorização dos salários, melhores condições materiais de formação, concepção democrática, prioritária e socialmente responsável da educação não resultam em nada melhor do que os suspeitos índices de qualidade de fundo empresarial, onde termos como “desempenho”, “impactos” e “eficiência” completam a modorra ideológica que disfarça a perversão dos valores.

Com a nova lei, a “cereja” nesse imbróglio é a satisfação que os setores privados não cansam de manifestar com a possibilidade de expansão do financiamento estudantil alcançar também o mestrado e doutorado à distância e também o ensino à distância para cursos de graduação.

A opinião pública, enquanto isso, permanece refém da imprensa, de mais um lote de tabelas e cifras de “progressão” de investimentos, de manifestações do governo de que tudo vai muito bem no país da Copa e de informações desencontradas em relação ao assunto. Sobretudo, a população segue trabalhando muito para colocar, o mais rápido possível, seus filhos nas escolas particulares, contratarem planos de saúde, segurança privada em suas ruas e ficar, finalmente, tranquila quanto os rumos das discussões sobre a coisa pública no Brasil. Tudo isso tem tido grande incentivo do governo federal, com sua política que associa a ideia de cidadania com o maior acesso ao consumo e, de preferência, com imensa renúncia fiscal como ocorre com o ProUni e o financiamento de automóveis, dinheiro este que deixa de ser aplicado em políticas sociais.

As leis e os documentos são abundância morta quando não são animados por uma concepção que coloque a educação pública e de qualidade para todos dentre as prioridades máximas do país. Esta é a grande ausência do “novo” PNE e permanece a determinar a lista infindável de fracassos nas políticas voltadas à educação.

Diretoria da Adunifesp-SSind – Gestão 2013-2015