Adunifesp-SSind na luta contra o Programa Escola Sem Partido

A Associação dos Docentes da Unifesp (Adunifesp-SSind) repudia o Programa Escola Sem Partido (ESP) que tem se proliferado em vários estados e municípios, informa a comunidade acadêmica sobre o movimento ESP e sugere a importância do amplo debate deste tema na UNIFESP às vésperas da realização de três conferências de Educação que discutirão o Plano Nacional de Educação (PNE) – 2014-2024.

O movimento político ESP surgiu em 2004 como iniciativa conjunta de estudantes e familiares empenhados em promover mudanças na estrutura jurídica da Educação para combater todo e qualquer conteúdo que envolve a participação dos alunos na gestão democrática e participativa das escolas (grêmios estudantis) e universidades (centros e diretórios acadêmicos), as pautas feministas, a igualdade de gênero, da igualdade racial, das liberdades religiosas, da valorização cultural de minorias e do pensamento crítico político e filosófico em todos os níveis (do Ensino Básico ao Ensino Universitário). O mentor da ESP é o advogado paulista Miguel Nagib que corrobora com uma rede difusa composta por corporações particulares de educação e de sistemas de ensino, famílias, partidos políticos ligados a determinadas empresas, igrejas e convicções doutrinárias cuja principal finalidade, no âmbito escolar, seria a de delimitar o papel do professor e da escola ao nível da instrução técnica, ou seja, como agentes responsáveis pelo ensino e não pela educação dos alunos.


O movimento que viola direitos humanos básicos (por ex., liberdade de expressão e de opinião) tem ganhado forças, por um lado, pelos vetos governamentais cedidos em função das pressões políticas aos programas que pretendiam promover a sua defesa, saber: (i) Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) – realizada pelo então Presidente Lula em 2009; (ii) proibição no Governo Dilma, em 2011, ao Programa Educacional Brasil Sem Homofobia no ensino fundamental e médio; e (iii) a partir de 2014 com a ampla campanha contra a diversidade sexual e cultural nos planos decenais de educação que inabilitou a educação para os gêneros e para os pertencimentos sociais como metas educacionais a serem cumpridas no país como um todo. Importa referir que há casos pontuais em que os planos municipais de Educação contemplaram a palavra diversidade, após resistência da comunidade local, dos professores das escolas básicas e professores das universidades na votação na câmara municipal. Há um caso em que o plano municipal de educação foi negociado pelos representantes das entidades, movimentos sociais e das universidades em reuniões antes de serem novamente colocados para a votação final na câmara municipal, reforçando a crucial importância da nossa participação em todos os momentos e da capacidade da nossa força política para barrar a ESP.

A força da ESP vem de movimentações dos setores sociais mais conservadores representados por alguns partidos políticos e por organizações como o Movimento Vem Pra Rua e o Movimento Brasil Livre (MBL), que defendem o neoliberalismo como única forma de organização econômica e social, evidenciando a não neutralidade do movimento.

Após o golpe de 2016, o movimento ESP é totalmente facilitado com as medidas antidemocráticas do governo Temer através da: (i) portaria 577/17 de 26/04/18 que desmonta o Fórum Nacional da Educação (FNE) que passa a ser definido e controlado pelo MEC, excluindo várias entidades, provocando a saída de outras e permitindo a entrada de setores privados e de entidades potencialmente mais alinhadas à proposta do governo ou que querem contrapartidas (por exemplo, aprovação dos PL da ESP) e (ii) Decreto de 27 de abril de 2017 que desconstrói o calendário da III Conferência Nacional de educação (CONAE/2018 sob o tema “A consolidação do sistema nacional de educação – SNE e o Plano Nacional de Educação – PNE: monitoramento, avaliação e proposição de políticas para a garantia do direito à educação de qualidade social, pública, gratuita e laica”), alteração justificada por questões partidárias de ambos os lados (governo Temer corrigiu o calendário porque o 1º semestre de 2018 foi definido no governo Dilma para fins eleitorais ou após as eleições de 2018 servirá para não mobilizar o país em torno das reformas educacionais impostas pelo governo Temer).

Atualmente, vários Projetos de Leis da ESP já foram aprovados nas câmaras municipais e estaduais, conforme mapa https://goo.gl/DkaDKs ou no blog Pesquisando o Escola Sem Partido:  https://pesquisandooesp.wordpress.com/ e facebook @contraoescolasempartido

Os PL assentam-se em 4 pontos (Carvalho, Polizel & Maio, 2016): a) a neutralidade política, ideológica e religiosa do Estado; b) pais ou tutores têm o direito de decidir sobre a formação religiosa e moral de seus filhos; c) os estudantes são a parte mais fraca na relação de ensino e de aprendizado; e, d) professores são doutrinadores ou um mal a ser combatido na garantia dessa neutralidade. Esses discursos enviesados e descaracterizados de muitos contextos sociais, teorias educacionais e regimes de leis têm influenciado cada vez mais a sociedade, inclusivamente, encontramos defensores da ESP na nossa comunidade acadêmica.

Assim, consideramos que o tratar o outro que pensa diferente meramente como inimigo, a ser combatido, dificultará todo e qualquer debate e diálogo com a tal pluralidade que defendemos e estaremos a fazer exatamente o que a ESP defende. O principal inimigo da hipócrita alegação de neutralidade, defendido pela ESP, são as organizações partidárias, especialmente as consideradas de esquerda, que segundo eles se intrometem nos conteúdos escolares por meio das condutas docentes ao abordarem temas e discussões como desigualdade, economia, gênero e etnia e, por esta razão, os temas devem ser abolidos do currículo e os professores impedidos de os abordarem. Ou seja, claramente é um ataque partidário à esquerda com viés ideológico conservador que pretende censurar temas e conteúdos de forma extremamente antidemocrática e autoritária e não são neutros como o discurso do PL faz parecer.

Além disso, todos os docentes da educação básica ao ensino superior são afetados pela ESP (ver os casos dos cursos sobre o golpe de 2016 e os processos que as universidades estão a sofrer) e podem ser fiscalizados (Carvalho, Polizel & Maio, 2016) e até criminalizados: a) se ampliarem os conteúdos previstos nas disciplinas a fim de discutir cenários políticos nacionais e internacionais; b) se indicarem leituras de livros de autores alinhados a correntes teóricas socialistas; c) se recomendarem leituras de autores que não defendem o capitalismo; d) se defenderem ou se alinharem com a concepção de que os gêneros são categorias sociais, políticas e construídas para além do caráter biológico dado ao nascimento; e) se indicarem leituras, movimentos ou manifestações que defendam direitos humanos ou f) se promoverem debates sobre estes temas nas escolas e universidades; entre outros.

Os 6 deveres do professor da ESP podem implantar um efeito de julgamento que criará “verdadeiros tribunais ideológicos e morais nas escolas [e universidades], transformando o espaço escolar [e acadêmico] em um ambiente arbitrário, acusatório, completamente contraproducente ao aprendizado” (CARA, 2016, p. 45).

Por esta razão, convidamos a comunidade acadêmica a se informar sobre a ESP porque, por vezes, os fundamentos políticos e ideológicos não estão expressos na redação dos projetos, mas aparecem destacados nas páginas do projeto (http://www.escolasempartido.org/) e de seus idealizadores e/ou apoiadores.

Adunifesp-SSind